quarta-feira, 29 de julho de 2009

Debate sobre Reforma Política traz questionamentos sobre a democracia

*redação: Tayse Falcão


Estudante de Jornalismo da Faculdade do Vale do Ipojuca (Favip) – Caruaru/PE


Reforma política foi o tema central do debate nesta segunda-feira (27/07), na TV-U. Paulo Rubem (PDT) foi o único político entrevistado pelo programa “Opinião Pernambuco”, conduzido pelo jornalista Cristiano Ramos. Participaram os cientistas políticos Túlio Velho Barreto e Adriano Oliveira. Os debatedores enfatizaram a importância da democracia e da construção da cultura política.


A reforma política é um tema recorrente na vida política brasileira. Está presente na vida dos congressistas há anos, mas sempre orientada pelos interesses eleitorais e partidários.


O deputado Paulo Rubem disse que a democracia é um meio para enfrentar as desigualdades sociais e a exclusão, promover a diversidade, fomentar a participação cidadã. “Isto significa uma reforma que amplie as possibilidades e oportunidades de participação política, capaz de incluir e processar os projetos de transformação social que segmentos historicamente excluídos dos espaços de poder, – como as mulheres, os/as afrodescendentes, os/as homossexuais, os/as indígenas, os/as jovens, as pessoas com deficiência, os/as idosos – de uma maneira geral trazem para o debate público”.


Para Túlio Velho Barreto, a construção de uma reforma política está inserida num processo mais amplo, e necessariamente diz respeito a uma mudança no próprio sistema político, na cultura política e no Estado. “Por isso, os princípios democráticos que devem nortear uma verdadeira reforma política são os da igualdade, da diversidade, da justiça, da liberdade, da participação, da transparência, e controle social. Mas ainda temos uma cultura democrática bastante fragilizada”, enfatiza.


Adriano Oliveira expõe que as coligações e a fidelidade partidária dificultam a reforma partidária, e “joga” uma pergunta aos telespectadores: o Estado brasileiro deve servir a quem/que?


Paulo Rubem reforçou ainda que estas mudanças/reformas só ocorrerão se existir um sistema público de comunicação, com princípios da democratização, do controle social, e do direito ao acesso às informações. Ele colocou como início “o acesso a internet como um meio de comunicação que está tornando um facilitador para o acompanhamento dos políticos.


Acessem a matéria na íntegra: www.paulorubem.com.br

terça-feira, 28 de julho de 2009

A reportagem que faltou

Por Rolf Kuntz em 28/7/2009


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva concordou em triplicar o preço pago ao Paraguai pela energia de Itaipu – de 120 milhões de dólares para 360 milhões de dólares anuais – e, além disso, decidiu permitir a venda direta de eletricidade no mercado brasileiro, num processo gradual, sem intermediação da Eletrobrás. Será preciso submeter as duas decisões aos Congressos dos dois países. Lula transmitiu ao colega Fernando Lugo, na sexta-feira (24/7), a disposição de oferecer melhores condições para a comercialização da eletricidade não consumida pelos paraguaios. O entendimento básico foi sacramentado no dia seguinte, depois de concluída a reunião de cúpula do Mercosul. Uma comissão terá 60 dias para dar a forma final à proposta de mudanças.


A imprensa brasileira cuidou do tema durante a semana toda. Acompanhou as conversas preliminares entre diplomatas e caçou detalhes a respeito de preços e de como os consumidores brasileiros serão afetados. Mostrou o empenho da diplomacia brasileira em fortalecer politicamente o presidente paraguaio. Mas o esforço de reportagem falhou num detalhe: ninguém tratou seriamente, pelo menos até o fim de semana, de confrontar a autorização oferecida ao Paraguai com as disposições do Tratado de Itaipu. Ainda na sexta-feira, o assessor especial da presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, havia chamado a atenção para uma dificuldade: os negociadores estavam procurando uma forma de não mexer no Tratado.


Ninguém parece ter tido o cuidado de perguntar onde estava o risco. A explicação não apareceu nas edições de sábado (25/7). No domingo (26), nenhum jornal explicou por que será preciso submeter inovações ao Congresso dos respectivos países.


Fontes à disposição
Se alguém tivesse tido curiosidade suficiente para ler o Tratado, poderia ter formulado algumas perguntas interessantes. O documento, assinado em 26 de abril de 1973, regula em dois artigos a divisão da energia produzida pela usina de Itaipu e as condições de comercialização do excedente.


Pelo artigo XIII, a energia "será dividida em partes iguais entre os dois países, sendo reconhecido a cada um deles o direito de aquisição, na forma estabelecida no artigo XIV", da parcela não utilizada pelo outro país para o próprio consumo. Segundo o artigo XIV, "a aquisição dos serviços de eletricidade da Itaipu será realizada pela Eletrobrás e pela Ande [Administración Nacional de Electricidad], que também poderão fazê-la por intermédio das empresas ou entidades brasileiras ou paraguaias que indicarem".


O texto parece claro: a compra e a venda serão sempre realizadas pela Ande e pela Eletrobrás, diretamente ou "por intermédio" de empresas ou entidades indicadas. Em outras palavras: quem comprar comprará em nome de uma das duas entidades estatais.


Perguntas evidentes:


1. É possível conciliar essas disposições com a venda de energia no mercado livre?
2. O simples fato de o Tratado não proibir expressamente esse tipo de venda corresponde a uma autorização?
3. Se a resposta à pergunta anterior for positiva, por que o artigo XIV designa explicitamente duas entidades vendedoras e compradoras?


Se o governo brasileiro decidiu aceitar a atuação da Ande como vendedora no mercado livre, algum assessor presidencial deve ter apontado uma base legal para essa decisão. Qual pode ser essa base? Pauteiros, editores e repórteres deveriam ter pensado em explorar esse tópico, procurando fontes oficiais e especialistas em direito internacional. Há alguns muito bons tanto em escritórios de advocacia quanto nas universidades.


O leitor dança


Nenhuma dessas perguntas é irrelevante. Durante muito tempo, o governo brasileiro, pressionado pelo paraguaio, aceitou em princípio discutir a elevação do preço pago pela energia, mas sempre rejeitou mexer no Tratado. Teria mudado de ideia?


À primeira vista, a autorização para a Ande ingressar no mercado, embora de forma gradual, colide com as disposições do artigo XIV. Especialistas podem propor uma interpretação diferente e mais favorável à decisão negociada entre os dois governos, mas seria preciso ouvi-los. Nesta, como em muitas outras coberturas, faltou a repórteres, pauteiros e editores aquela preocupação simples e elementar: examinar os textos.


Essa falha ocorre não só em coberturas de eventos internacionais, mas também no acompanhamento rotineiro de projetos em tramitação no Congresso. Os jornais publicam as opiniões de políticos e técnicos favoráveis e contrários ao projeto, mas com frequência deixam de cumprir a tarefa elementar publicar o texto ou um bom resumo de seus pontos mais polêmicos.


O leitor acaba acompanhando o assunto por meio das palavras das pessoas interessadas, mas não tem a informação mínima e básica sobre o tema em discussão.


Qual a relevância dos jornalões?

Por Venício A. de Lima em 28/7/2009




A atual conjuntura política, marcada pela crise no Senado Federal e pelas suspeitas em relação à administração da Petrobras, recoloca em pauta uma velha questão sobre o alcance e a influência dos jornalões da grande mídia: a Folha de S.Paulo, o Estado de S.Paulo e O Globo: merecem eles a importância que a elite política e os "intelectuais" lhes atribuem na formação da opinião pública brasileira, vis à vis, por exemplo, a televisão e/ou a internet?



Há alguns anos, muito antes da expansão da internet, venho insistindo que não (ver, por exemplo, "Jornal ou TV: qual mídia é mais importante na formação da opinião pública brasileira?" in Comunicação, Mídia e Consumo, vol. 2, nº 3, março de 2005). Não merecer a importância que se atribui a eles não significa que devam ser ignorados. Absolutamente. Significa, ao contrário, não se atribuir a eles uma relevância nacional que, se algum dia tiveram, não têm mais.



A apresentação deste argumento, todavia, mesmo diante de várias evidências, inclusive sobre a penetração da internet e a relativa democratização do seu acesso, é frequentemente rechaçada por diferentes interlocutores que acreditam ser ainda os jornalões e seus colunistas os principais responsáveis pela definição da agenda pública nacional.



O tema é complexo e, claro, não se pretende esgotá-lo e, muito menos, resolvê-lo. Apenas aceitar o desafio de continuar o debate.



Dois aspectos do argumento



Não vou retomar aqui todos os aspectos do argumento. Os dados relativos à queda de circulação dos jornalões são por demais conhecidos. Da mesma forma, já se discutiu muito sobre o "aproveitamento", por emissoras de rádio e televisão, via agências de notícias, das matérias produzidas pelos jornalões. Creio que não há dúvida também sobre as importantes questões que surgiram recentemente quanto à credibilidade dos jornalões. Não pretendo, portanto, retomar esses pontos. Quero apenas lembrar dois aspectos.



Primeiro, o caráter regional dos jornalões. O Globo é, sobretudo, um jornal carioca, da mesma forma que a Folha e o Estadão são jornais paulistas. Eles não são jornais que circulam e/ou são lidos nacionalmente.



O segundo aspecto é, na verdade, um desdobramento do primeiro e merece ser explorado um pouco mais. Para quem exatamente os jornalões estão falando?



Uma das linhas de pesquisa sobre "a produção das notícias" (newsmaking) que se consolidou dentro do campo de estudo da Comunicação, nos últimos anos, busca relacionar a imagem da realidade social construída na e pela mídia aos valores partilhados e interiorizados pelos jornalistas acerca de como devem exercer sua profissão.



Há evidencias de que, na seleção das matérias a serem noticiadas, predominam as referências implícitas ao grupo de colegas e às fontes em relação às referências implícitas ao próprio público, isto é, às audiências e/ou aos leitores. Isto significa que, enquanto o público em geral é pouco conhecido pelos jornalistas, o contexto profissional-organizativo-burocrático imediato exerce uma influência decisiva na seleção do que vai ser noticiado. Vale dizer, a origem principal das expectativas, orientações e valores profissionais dos jornalistas não é o "público" para o qual eles e elas deveriam escrever, mas o "grupo de referência" constituído, sobretudo, por colegas e fontes.



Na verdade, as fontes com as quais os jornalistas "conversam" regularmente constituem um público fundamental para suas próprias notícias. Jornalistas recebem muito mais "reações" sobre suas matérias, coberturas, reportagens e análises de suas próprias fontes do que de qualquer outro grupo social. Eles estão permanentemente em contato com suas fontes e delas recebem cumprimentos, correções, reclamações, afrontas, negativas de acesso, cassação de credenciais etc.



Verifica-se, portanto, que, como afirmou Bernardo Kucinski, "a elite dominante é, ao mesmo tempo, a fonte, a protagonista e a leitora das notícias; uma circularidade que exclui a massa da população da dimensão escrita do espaço público". Ora, essa constatação é verdadeira para todo o território nacional. Desta forma, além de não ser nacional, os jornalões são excludentes porque lidos, sobretudo, apenas pela elite brasileira – seja ela nacional, regional ou local.



E as conseqüências?


A prática profissional do jornalismo, não só nos jornalões, cria uma relação circular entre jornalista-fonte-jornalista que se auto-alimenta permanentemente. E essa relação circular jornalista-fonte-jornalista tende a se tornar assimétrica, enfraquecendo a fonte e fortalecendo os jornalistas. Enfraquece a fonte na medida em que, para tornar públicas as informações de seu interesse, ela fica "cativa" de um pequeno grupo de jornalistas. Por outro lado, fortalece os jornalistas (a) por eles terem o privilégio do acesso contínuo a fontes "autorizadas" e "acreditadas"; (b) por terem a opção de selecionar, omitir, enfatizar e distorcer informações; e, ainda, (c) por "operarem" protegidos e no interesse dos grupos de mídia no qual trabalham.



Parece correto afirmar, portanto, que os jornalões e seus jornalistas funcionam dentro de uma circularidade restrita a camadas específicas da elite política e "intelectual" brasileira. Nada mais do que isso.



Registre-se que a supervalorização indevida do poder dos jornalões, muitas vezes, provoca uma avaliação equivocada de qual realmente é a "opinião pública" majoritária no país e, consequentemente, pode conduzir a equívocos importantes, inclusive na formulação de políticas públicas por parte de setores do poder público.



Resta saber qual o poder concreto que esta elite política e "intelectual" exerce na vida política nacional. Nos processos eleitorais, se a eleição presidencial de 2006 servir como exemplo, as diversas "esferas públicas" que coexistem e funcionam na sociedade brasileira, fora do alcance dos jornalões, revelaram uma relativa autonomia.



Será que funciona também assim nos outros inúmeros aspectos da vida cotidiana? Essa é a questão.



Fonte: http://www.obervatoriodaimprensa.com.br/

Paulo Rubem assina documento pela criação da Frente em Defesa do Diploma de Jornalista

A luta em defesa do diploma de jornalista continua, apesar do Supremo Tribunal Federal (STF) ter proferido decisão, no dia 17 de junho, extinguindo a exigência do “canudo” para o exercício da função. Ontem (27.7), o deputado Paulo Rubem Santiago (PDT) assinou a adesão à Frente Parlamentar em Defesa da Exigência do Diploma de Comunicação Social/Jornalismo. O projeto está sendo mobilizado pelo Sindicato de Jornalistas de PE (Sinjope), e pelos sindicatos em todo o País, proposto pela deputada federal Rebecca Garcia (PP-AM).



O presidente do Sinjope, Ayrton Maciel, e o jornalista Roberto Numeriano, informaram que uma das ações imediatas dos Sindicatos e da categoria é buscar em seus estados e regiões, neste período em que o Congresso Nacional está em recesso, contato com os parlamentares que ainda não assinaram a proposta de constituição da Frente Parlamentar em Defesa do Diploma. “Para oficializar sua criação no Congresso, são necessárias 191 assinaturas”, lembra Numeriano, registrando que a proposta já tem cerca de 150 apoiadores entre deputados e senadores. Com a frente formada, a perspectiva de agilizar a tramitação das matérias de interesse da categoria é maior.



No manifesto dos jornalistas pernambucanos, o Sinjope enfatiza que “o fim do diploma poderá implicar no cerceamento à liberdade de expressão e de opinião”, traduzindo isso num “jornalismo menos comprometido com a qualidade e isenção essenciais, propiciadas pelo ensino superior comprometido com o interesse público, a ética e a verdade”.


sexta-feira, 24 de julho de 2009

CONGRESSO EM CRISE: Caminho sem volta

Por Alberto Dines em 24/7/2009
Comentário para o programa radiofônico do OI, no ar em 24/07/09


O presidente Lula pediu que a sociedade brasileira não confunda os crimes – uma coisa é nepotismo, outra é lobby, uma coisa é corrupção, outra é assassinato.


O conteúdo das gravações das conversas de Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, é dinamite pura. À primeira vista, parece inocente, mais um dos milhares de casos de nepotismo. Porém uma avaliação mais detalhada das transcrições evidencia prevaricação e quebra de decoro. A parte mais explosiva das conversas não está no pedido de emprego para o namorado da neta, a bomba está na conversa de Sarney pai com Sarney filho congratulando-se pela concessão de mais uma repetidora de TV para o conglomerado de mídia da família, um dos maiores do Nordeste.


Um congressista não pode acumular interesses - ou serve ao Estado ou serve aos seus negócios. Um legislador que supervisiona concessões não pode ser simultaneamente concessionário de um serviço público.


A alegre conversa captada pela Polícia Federal comprovou uma situação ilícita e inconstitucional. O chefe do Legislativo está usando o seu imenso poder para beneficiar-se política e materialmente.


A imprensa não priorizou até ontem este grave delito porque José Sarney quando envergava a faixa presidencial inventou a trapaça de trocar apoios por concessões de rádio e TV aos congressistas. Calcula-se que metade dos parlamentares esteja na mesma situação delituosa.


Acabar com a farra das concessões de radiodifusão poderia sanear definitivamente a estrutura da nossa mídia eletrônica – mas o governo teria coragem de enfrentar o ressentimento de metade das duas casas legislativas? Claro que não.


Os conglomerados de mídia seriam capazes de fazer uma cruzada que poderia quebrar o seu poder? Claro que não.


A gravação das conversas telefônicas dentro do clã Sarney teve amparo legal, ilegal foi o vazamento de informações protegidas pelo segredo de justiça. No entanto, ninguém discute esta questão. É uma formalidade e a sociedade brasileira tem absoluto desprezo pelas formalidades.


O processo de alijar Sarney da presidência do Senado é irreversível, mas o vale-tudo pode levar a uma perigosa ruptura. Constantemente provocada e desafiada, a mídia agora já não tem condições para pisar no freio.



MUNDO VIRTUAL - Mídia convencional e Twitter: relações e conexões

Por Valério Cruz Brittos e Taize Odelli em 21/7/2009




Na digitalização, vivencia-se a integração da mídia tradicional com outros setores, especialmente aqueles relacionados com as inovações trazidas pela digitalização. Entre os mais significativos está a internet. Depois de jornais, emissoras de TV e de rádio adentrarem o mundo virtual com portais para divulgação de conteúdo produzido, utilizando ainda blogs para dar maior visibilidade às suas ações e avançar na proximidade com o público, as indústrias culturais estão se inserindo no novo fenômeno da internet: o Twitter.


O Twitter é um microblog onde seus usuários fazem postagens de, no máximo, 140 caracteres.


Os twitts, como são denominados, podem receber respostas de quem está seguindo a pessoa. Assim, ele também se caracteriza como uma espécie de site de relacionamento. O Twitter caiu nas graças da mídia depois que artistas famosos, como Demi Moore e seu marido, Ashton Kutcher, passaram a usar a ferramenta. No Brasil, o site vem crescendo e, aos poucos, vai conquistando internautas que até então só utilizavam o Orkut, o qual apresentou baixa nos acessos. Porém, o Twitter não é apenas mais uma moda virtual, essencial para todos os usuários da internet que queiram estar "antenados" às tecnologias. Além de reunir pessoas comuns e artistas que querem estar em contato mais direto com o público, o mecanismo tomou grande proporção dentro da mídia convencional.



Informação twitt a twitt



O Twitter tornou-se uma importante ferramenta na vida do internauta brasileiro. Ele foi adotado não apenas como um meio de se comunicar com amigos e familiares. Hoje, ele é usado na difusão de informação. Jornais, sites, redes televisivas e outros meios de comunicação possuem contas no Twitter, onde divulgam notícias e promoções. Em pesquisa realizada pela Bullet, em abril de 2009, 80% dos usuários do site disseram seguir ou já terem seguido alguma agência de notícias.


A ferramenta mostra-se útil também na hora de burlar a censura. No Irã, o presidente reeleito Mahmoud Ahmadinejad, tentou controlar a internet para desestabilizar a organização de protestos contra a sua reeleição. Para contornar a tentativa de censura por parte do governo iraniano, jornalistas e civis passaram a divulgar e organizar os protestos através de blogs e, principalmente, do Twitter. Uma manutenção no site que havia sido agendada para o período das eleições foi adiada para não deixar os iranianos sem essa ferramenta de divulgação. Golpe de marketing ou não, a decisão tomada pelos dirigentes do Twitter foi aplaudida pela maioria.



Não só as agências de notícias invadiram o microblog. Agências de empregos entraram na onda da comunicação por 140 caracteres e agora divulgam no site suas vagas de emprego atrás de candidatos. O que começou com empresas de informática vai se expandir para todas as áreas profissionais, segundo especialistas. Logo, o Twitter se mostrou uma ferramenta não só de contato com conhecidos, mas também de ampliação com contatos profissionais.



Em meio a isso, o usuário comum do Twitter também é visto como divulgador. Uma pesquisa realizada pela Harvard Business School mostrou que o microblog não é só mais uma ferramenta virtual de conversação, ou seja, de apenas manter contato com as pessoas. A análise de tráfego e perfis dos internautas apontou que o Twitter é um instrumento de difusão da informação, como o rádio e a televisão. A pesquisa realizada pela Bullet definiu que a maioria dos usuários do Twitter, jovens entre 20 e 30 anos, além de possuir blogs, repassa para seus "seguidores" links de notícias, artigos, vídeos e outros conteúdos considerados interessantes. As notícias e vagas de empregos divulgados no site pelas agências não só abrangem o número de pessoas que seguem suas páginas, mas também outros usuários, que se informam "de twitt a twitt".


terça-feira, 21 de julho de 2009

A história jogada no lixo

Por Alberto Dines em 21/7/2009
O Estado brasileiro judicializou-se, transferiu-se para os tribunais. A inoperância e desqualificação do Legislativo somada ao caráter circunstancial e casuísta das ações do Executivo levam o Judiciário a assumir uma série de atribuições indevidas.

Atrás desta grave disfunção estrutural está o velho mandonismo e a incapacidade dos agentes políticos para buscar algum tipo de consenso e conciliação. Preferem os impasses logo encaminhados às diferentes instâncias judiciais mesmo quando as divergências são de ordem conceitual, não envolvendo ilícitos ou ameaças.

O STF tem sido a instituição mais procurada para dirimir controvérsias, digamos impertinentes, porque a Constituição de 1988, apesar da fama progressista e cidadã, apresenta enormes lacunas e imprecisões. A pressa em promulgá-la permitiu a sobrevivência de estatutos produzidos durante o regime militar designados aleatoriamente como "entulho autoritário".

Nem a Lei de Imprensa nem a discussão sobre a obrigatoriedade do diploma específico para o exercício de jornalismo deveriam ter sido encaminhadas à suprema corte. Foi um equívoco – ou leviandade – submetê-las à apreciação de um ministro-relator, e em seguida aos seus dez pares, nenhum deles disposto a e suficientemente preparado para mergulhar numa questão complexa e multifacetada.

Tanto o ministro-relator Gilmar Mendes como aqueles que o acompanharam na decisão não conseguiram convencer a sociedade de que haviam entendido a chamada Questão do Diploma de Jornalismo. Deixaram-se iludir pelos autores da representação. É incrível, mas é imperioso e penoso registrar que Suas Excelências, Meritíssimos e Meritíssimas, foram ingênuos. Ao invés de convocar peritos, contentaram-se com constatações simplistas, produzidas pelo senso comum e lugares-comuns.
Reconhecimento da profissão

As entidades patronais que direta ou indiretamente patrocinaram a causa fixaram-se na questão do certificado e menosprezaram o ponto crucial: a existência de uma profissão multi-secular, na verdade bi-milenar, reconhecida em todo Ocidente.

Era mais fácil e mais conveniente eliminar a obrigatoriedade do certificado sob o pífio pretexto de universalizar o acesso à informação do que reconhecer que os precursores dos jornalistas contemporâneos foram os funcionários romanos chamados de diurnarii (daí giornalisti e journalistes). Também chamados de actuarii porque se encarregavam de preparar as atas ou Actas informativas que circulavam na capital do império a partir do século II a.C.

A profissão de jornalista, reconhecida e legalizada, começou com a produção das Actae Diurnae (Atas Diurnas), também conhecidas como Atas Públicas, Atas Urbanas ou ainda Diurnálias. Mas também circulava uma Acta Populi e, para comprovar que nada se cria, tudo se copia, havia até uma Acta Senatus, secreta, que certamente inspirou o senador José Sarney a produzir seus boletins confidenciais.

Os proto-jornalistas foram estudados pelo historiador-jornalista Carlos Rizzini em O Jornalismo antes da Tipografia (Cia. Editora Nacional, S. Paulo, 1968, pp. 4-10). Mais recentemente, o historiador português Jorge Pedro Souza ofereceu preciosas informações sobre uma atividade exercida há dois milênios que o espirituoso presidente do STF, Gilmar Mendes, considera equivalente à dos mestres-cuca (Uma Breve Historia do Jornalismo no Ocidente in Jornalismo: Historia, Teoria e Metodologia, pp 34-44, Edições Universidade Fernando Pessoa, Porto, 2008).
Hipólito e os redactores

Na apresentação da primeira edição do Correio Braziliense, o primeiro periódico a circular sem censura no Brasil e em Portugal, seu autor, o gaúcho Hipólito da Costa, escreveu com data de 1º de Junho de 1808 uma profissão de fé sobre a nobre missão dos jornalistas aos quais designa como redactores das folhas públicas.

Hipólito delineava de forma inequívoca uma função social e um ofício. Sua convocação dirigia-se primeiramente aos que vivem em sociedade e, em seguida, àqueles que deveriam servi-la. O patriarca do jornalismo estabelecia uma clara diferenciação entre o cidadão e aqueles que devem informá-lo. Não regulamentou a profissão, concedeu-lhe um status especial. Distinguiu-a com a missão de levar a colônia a superar os 308 anos de trevas e silêncio e preparar a sua emancipação.

Dois séculos depois, a conjugação de um Estado capenga e uma corte desnorteada – ou mal informada – jogam nossa história no lixo.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Profissionais aderem ao "jornalismo em pílulas", estilo Twitter

Postado por Carlos Castilho em 9/7/2009 às 4:28:48 PM


O respeitado jornal norte-americano The Christian Science Monitor publicou esta semana um artigo em sua página de opinião sugerindo que o prêmio Nobel da Paz de 2009 seja concedido ao Twitter, um programa de micro-mensagens com até 140 caracteres que está revolucionando a política mundial.

O programa lançado em 2006, para circular mensagens tanto pela Web como pelos celulares, bateu todos os recordes de popularidade na Web, tornando-se o terceiro site mais visitado da rede, com cerca de 55 milhões de acesso mensais e um índice de crescimento estimado em 1.382%, em fevereiro de 2009.

Depois de tornar-se um modismo entre os jovens no mundo inteiro, o Twitter, também conhecido como “jornalismo em pílulas” passou a ser a ferramenta onipresente em todos os grandes eventos noticiosos desde o ano passado e em especial desde o inicio de 2009, como a queda do Airbus no rio Hudson, em Nova Iorque, e os protestos anti-governamentais em Teerã.

Agora o micro-blog ganha espaço na área jornalística com a multiplicação das experiências de profissionais e com o surgimento de iniciativas destinadas a auxiliar os interessados no uso da ferramenta para captação e divulgação de noticias.

O Twitter segue a mesma trilha dos portais noticiosos de 2002 a 2004 e dos blogs jornalísticos, de 2006 em diante. Inicialmente foram vistos com desconfiança pelos jornalistas que depois os incorporaram à suas rotinas de trabalho.

Todas estas ferramentas têm em comum a capacidade de multiplicar a captação e divulgação de dados, fatos e notícias, tornando cada vez mais real a teoria da “nuvem informativa”. Esta nuvem seria formada pelos conteúdos informativos que circulam em dispositivos móveis de comunicação.

Aqui no Brasil, o Twitter já entrou no clima pré-eleitoral graças à ação de um número cada vez maior de jornalistas profissionais, dirigentes partidários, candidatos potenciais e ativistas políticos que usam a ferramenta para incidir sobre a agenda pública de debates.

O site Politweets publica os endereços de políticos brasileiros que estão usando o Twitter para relacionamento com eleitores. Nele pode-se ver que o paulista José Serra é o único governador com um Twitter que obviamente está todo voltado para a campanha eleitoral presidencial de 2010.

Há 16 senadores twitando[1], entre eles, cinco do PSDB, quatro do PT e três do DEM. Na Câmara de Deputados, 36 parlamentares admitiram estar usando a ferramenta, com uma predominância dos democratas e tucanos.

Mas o grande fenômeno comunicacional do momento no Brasil é o movimento “Fora Sarney” que em cinco dias conseguiu reunir quase 15 mil mensagens de internautas que exigem o afastamento do presidente do Senado, acusado de corrupção e nepotismo.

Os twiteiros contrários à Sarney já organizaram manifestações em frente aio Congresso, em Brasília, e na avenida paulista, em São Paulo. As duas não reuniram muita gente e foram classificadas como ensaio geral. Quem quiser ter uma idéia do que está sendo discutindo no movimento, basta inserir a hashtag[2] #forasarney , no espaço para buscas na página do pessoal dentro do Twitter. Ali estão listados todos os twits recentes postados por internautas.

O aumento da circulação de informação na twitosfera[3] está atraindo jornalistas que passaram a usar a plataforma tecnológica como ferramenta para procurar e divulgar notícias. O repórter norte-americano Ken Ward tornou-se famoso por ser um dos primeiros e usar o Twitter para produzir reportagens investigativas sobre a indústria do carvão nos Estados Unidos. Ward monitora os twits de executivos e consultores no segmento.

Hoje já há dezenas de outros profissionais usando o mesmo recurso, tanto de forma autônoma como em empresas. O projeto ReporTwitters oferece uma plataforma de troca de experiências e informações entre jornalistas que atuam na twitosfera. Outra ferramenta muito usada é o JournoTwit, que organiza o material dos profissionais cadastrados no site, separando seguidos e seguidores, bem como os retwits (RTs)[4] feitos com o mesmo texto.

Aqui no Brasil, o jornalista Marcelo Tas é considerado o twiteiro número um, mas o uso da ferramenta é mais intenso, embora menos visível, entre jornalistas iniciantes como é o caso do estudante e repórter Glauber Macário. São eles que estão criando a grande massa de repórteres online que começam a gerar conteúdos que depois serão processados pelos sites de jornais e formadores de opinião.

É o que acontece como Jay Rosen e Dave Winer, dois gurus do jornalismo na Web mundial, que criaram o twit Rebooting The News onde eles discutem notícias produzidas por twiteiros famosos e anônimos, tanto no universo acadêmico como no jornalístico.

[1] Twitando – neologismo criado a partir de outro neologismo, twit, que é o nome dado a uma mensagem postada na plataforma Twitter.
[2] Hashtag – expressão inglesa para indicar uma área de interesses de usuarios do Twitter. Ela permite evitar resultados não desejados numa busca entre twits.
[3] Twitosfera – neologismo criado para definir o conjunto das pessoas que usam o Twitter. É uma analogia com a blogosfera, dos blogs.
[4] Retwits – nome dado a um twit que é reenviado para terceiros.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Momento da verdade

Postado por Luiz Weis em 6/7/2009 às 6:22:24 PM



Vem de antes da internet – a rigor, começou com o aparecimento dos canais de notícias 24 horas por dia – a ideia de que a função primária dos jornais impressos se tornou explicar os fatos e não apenas apresentá-los.

Em lugar do clássico “o que, quando, onde e como”, a prioridade, aquilo que faria a diferença entre a imprensa escrita, de um lado, e o rádio e a TV, de outro, seria o “por que”.

Não que os diários de qualidade e as melhores revistas semanais já não estivessem atentos para fornecer o que se passaria a chamar, machucando os tímpanos, “informação contextualizada”.

Mas desde sempre – e muito mais desde o advento da blogosfera – paira uma confusão entre explicar e interpretar. Nada mais corriqueiro do que acusar a imprensa de “editorializar” a informação, a pretexto de lhe dar sentido.

Criou-se uma situação paradoxal. Ao mesmo tempo em que se passou a cobrar dos jornais, cada vez mais insistentemente, que lançassem luzes sobre os acontecimentos, revelando o que poderia estar por trás deles, assim como o seu parentesco com outros eventos, contemporâneos ou passados, manteve-se a exigência tradicional de que os periódicos deixassem que os fatos “falem por si” para os leitores “julgarem por eles mesmos”.

Os mais veementes cobradores do presumível caráter “objetivo” da informação jornalística eram, são – e continuarão a ser enquanto existir jornalismo – todos aqueles protagonistas do noticiário que dizem que a imprensa é injusta com eles ao pôr em perspectiva distorcida as suas ações.

Há um ponto válido, em princípio, nesse tipo de crítica. A multiplicação explosiva dos canais de informação tornou mais difícil para os interessados mentir pura e simplesmente na exposição dos fatos – a não ser que se acredite na teoria consipiratória segundo a qual a a grande imprensa inteira é capaz de se articular, por motivos ideológicos, para mentir em coro contra ou a favor de algo ou alguém, promovendo uma das tais “campanhas midiáticas”.

Assim sendo, a tendência seria o deslocamento do espaço para a falsificação deliberada da descrição dos acontecimentos, a mentira escrachada, para o ato de situá-los, a mentira dissimulada.

Mas isso pressupõe que o aprofundamento da notícia seja algo que se possa fazer arbitrariamente numa redação séria. Na verdade, quando um jornal ou revista procura seguir os padrões estabelecidos do ofício, a atividade de ir além da superfície das coisas requer uma apuração incomparavelmente mais trabalhosa do que o mero registro dos eventos ostensivos.

O tal do contexto não nasce da cabeça do redator mas do chão percorrido pelo repórter. Não é questão de opinião, mas de investigação. Exige, além de pesquisas frequentemente tediosas, que demandam tempo, paciência e conhecimento do assunto, a identificação de fontes que não apenas saibam do que estão falando, mas que falem coisas diferentes a respeito, para o leitor ter diante de si os diversos lados da questão.

Ora, direis, na prática a teoria é outra. Se e quando é, a causa costuma estar antes no mau trabalho do que na má intenção. A incompetência – para resumir numa palavra, quem sabe à falta de melhor, tudo que em geral contribui para o jornalismo deficiente – é muito menos mencionada pelos acusadores da mídia do que seria correto.

É simples para quem não conhece “como se fazem as salsichas” dizer que elas não prestam porque o fabricante quer envenenar os seus consumidores. Para continuar com a analogia, ingredientes mal escolhidos, desleixo no preparo, salsicheiros destreinados e assoberbados, escasso controle de qualidade do processo e do produto são de longe motivos mais comuns do que o interesse em enganar para a indústria soltar na praça mercadoria estragada.

E esses motivos contam tanto mais quanto mais especial o embutido. As chances de fazer um serviço de segunda variam na razão direta da complexidade da tarefa. É preciso que pauteiros, repórteres e editores sejam muito pernas-de-pau para errar quando se trata de transmitir ao público as realidades evidentes. Mas, quando se trata de garimpar os seus nexos subterrâneos, até mesmo os seus colegas mais preparados entregam bolas quadradas.

À medida que a imprensa de papel, correndo atrás do prejuízo, se põe a competir com a blogosfera valorizando a explicação dos acontecimentos – terreno que tem tudo para lhe ser favorável, tendo em vista, de um lado, a sua estrutura e, de outro, a propensão dos adversários para a chutometria –, ela enfrenta o seu momento da verdade (sem jogo de palavras).

O desafio do jornalismo tradicional, portanto, é se fazer indispensável não porque seja o primeiro com as últimas, o que é página virada na sua história, mas porque seja capaz de dizer, convincentemente, o que elas significam.

A captura da informação exclusiva – esse superpoderoso estimulante que corre na veia das redações – deve cada vez menos dar conta do recado. O destino da imprensa organizada depende da sua aptidão para persuadir as novas gerações de potenciais leitores de que, no dia a dia, ela é imbatível em destrinchar o funcionamento do mundo.

Se a indústria da notícia não se transformar em indústria da notícia explicada, a sua ausência, como se diz, preencherá uma lacuna.

O pior é quando jornais e revistas parecem achar que fizeram a sua parte concentrando-se no varejo e entregando o atacado – os seus porquês – a articulistas. Cobrem, por exemplo, os casos mais espetaculares da barbárie no trânsito das grandes cidades brasileiras, mas raramente investem em reportagens de fôlego sobre essa rotina alarmante.

O equivalente a isso, mas não o substituto disso, saiu no caderno Aliás do Estado de domingo, 5, sob a forma de uma perturbadora pensata do sociólogo José de Souza Martins, professor emérito da USP.

Eis o artigo, uma pauta pronta, intitulado “Uma sociedade sob as rodas”:

“Dados do Ministério da Saúde de 2003, divulgados num estudo da Fundação Seade, indicam que a taxa de mortalidade por atropelamento no Brasil era de 5,6 óbitos por 100 mil habitantes, quase três vezes mais do que nos Estados Unidos, Inglaterra e Canadá. São países mais adaptados, regulamentados e punitivos no que se refere ao uso violento de veículos. A taxa média relativa à mortalidade masculina em atropelamentos no Brasil mais que dobrava: 9 por 100 mil. Em vários Estados a taxa subia para 12 por 100 mil. Quanto às mulheres, a taxa é de 5 óbitos por 100 mil habitantes.

A legislação mais realista e dura, de 1997, e o novo Código Nacional de Trânsito, de 1998, produziram um declínio significativo na mortalidade por atropelamento. Em São Paulo, essas ocorrências caíram pela metade, entre 1996 e 2005, de 12 mortes por 100 mil habitantes para 5,1 mortes por 100 mil. O estudo mostra também que a curva estatística das mortes por atropelamento cresce regularmente até os 40 anos de idade das vítimas, estabiliza nesse nível até os 55 anos e volta a crescer, verticalmente, daí em diante, para homens e mulheres.

Idosos são as grandes vítimas de atropelamentos, que constituem também a terceira causa da morte de crianças. No caso dos idosos, as hipóteses mais prováveis para maior exposição à morte por atropelamento são as notórias: diminuição da visão, da audição e da capacidade motora. Nessa perspectiva, corremos o sério risco de concluir que a culpa é da vítima.

A maior exposição de crianças e idosos ao risco de morte por atropelamento sugere, na verdade, que esta sociedade não está preparada para assegurar lugar e vida a multidões de desvalidos por idade. É velha e infeliz característica da sociedade brasileira considerar cidadãos unicamente os que estão em idade produtiva, o chamado vigor da idade. Os semáforos abrem para pedestres que podem atravessar a rua na velocidade conveniente para o carro. As faixas de pedestres não servem para protegê-los. O único verdadeiro cidadão deste país é o automóvel, cheio de direitos. Aqui, o carro desempenha praticamente a mesma função que o revólver desempenhou no oeste americano no século 19, quando cada um fazia valer a sua lei.

No trânsito, diariamente, testemunhamos a agressividade de motoristas que fazem suas próprias regras de trânsito e tornam-se violentos, simplesmente porque estão dentro de um carro. A lei pune os alcoolizados, mas não pune os que estão bêbados de poder na direção. Cometem abusos de toda ordem, não raro com inocentes vítimas fatais. Para não falar nos mutilados, que carregarão para o resto da vida as sequelas da irresponsabilidade alheia, das famílias órfãs, pais e filhos.

A facilidade com que se paga fiança após um morticínio para sair leve e lampeiro e aguardar julgamento em liberdade deveria ser reexaminada à luz da experiência positiva da legislação mais dura de 1997 e 1998, que reduziu pela metade as ocorrências fatais. Esse tipo de delinquente potencial não sente no coração os sofrimentos que causa, mas sente-o no bolso e nas grades. Logo, é no bolso e na privação imediata de liberdade que, nos casos de comprovado dolo, deveria incidir a política de redução do número de mortes por atropelamento. Enquanto se achar que morrer ou ficar mutilado num acidente de trânsito é uma fatalidade, ficaremos no marco da barbárie.

É evidente que há uma imprudência de pedestres que concorre para os acidentes. Andar pela rua e não pela calçada, à noite, com roupas escuras é pedir para ser atropelado. Uma campanha educativa nos reeducaria para o fato de que o mundo já não é dos pedestres e que eles também têm de estar informados sobre regras e perigos de trânsito. Aliás, não é preciso estar na rua para ser atropelado. Ainda nestes dias pessoas foram atropeladas na calçada e há os que são atropelados dentro de casa! É verdade que pedestres são obrigados a caminhar pelas ruas, especialmente velhos e crianças, porque as calçadas convertidas em rampas de acesso a garagens têm degraus que podem chegar a meio metro de altura, tornando-as inúteis.

Nos atropelamentos mais graves, sobretudo envolvendo ônibus e caminhões, é comum o argumento de que foi falha de freios. Falha de freios é falta de revisão e cuidado, responsabilidade do motorista, mas também do dono.

Atropelamentos ocorridos em diferentes lugares do Brasil durante o mês de junho podem ser vistos numa perspectiva que acrescenta indicações aos fatores dessas ocorrências letais. Em Pilar, na região metropolitana de Maceió, no dia de São Pedro, um ônibus arrastou cinco caminhões que transportavam festeiros na caçamba, atropelou e matou 6 cavalos, também de festeiros, atropelou um grande número de pedestres de um cortejo junino e deixou 5 mortos e 77 feridos. Na Rua da Feira, em Bangu (RJ), na véspera de São Pedro, um comerciante, conhecido no bairro por ser contumaz na bebida e dirigir em alta velocidade, com a carteira vencida, atropelou os participantes de outra festa junina, derrubou um muro e um poste e matou 5 pessoas. Tentou fugir sem prestar socorro. Foi agarrado e quase linchado pelas testemunhas. Pagou R$ 800 de fiança e foi para casa.

Esses dois casos, como muitos outros, demonstram que existe no Brasil uma guerra de culturas, com vítimas fatais. No uso civilizado da rua em ocasiões festivas da tradição, o verdadeiro cidadão recupera seus direitos sobre o espaço público. Mas motoristas irresponsáveis avançam sobre eles armados com seus veículos e sua cachaça para impor-lhes a nova ordem da máquina mortal. Somos um país anômalo. Chegamos à modernidade do veículo automotor sem termos chegado à civilidade da competência profissional para ter o direito de usá-lo.”